Impeachment, Petróleo e China

O dia mostrou claros sinais de fragilidade dos mercados financeiros globais, que ainda estão a mercê da dinâmica do petróleo. Com elevada volatilidade ao longo de toda a quarta-feira, após operar em alta boa parte da manhã, acabou apresentando rápida e acentuada queda no início da tarde, levando consigo as bolsas norte americanas e criando um cenário um pouco mais disseminado de “risk-off” ao redor do mundo.

Minha visão em relação aos mercados permanece inalterada. Não vejo valor nas bolsas dos EUA nos atuais níveis, frente as inúmeras incertezas de cenário. Devemos ver uma volatilidade mais alta em torno dos atuais níveis, com as oportunidades sendo criadas em setores específicos. Acredito que o dólar ainda tenha espaço para mostrar bom desempenho contra as moedas emergentes e dependentes de commodities, e vejo o atual equilíbrio dos ativos no Brasil como um “equilíbrio instável”. Acredito que observamos uma deterioração adicional dos fundamentos econômicos (crescimento, inflação, fiscal e etc) nas últimas semanas, que não estão sendo devidamente precificados nos ativos locais. O aumento expressivo da probabilidade do impeachment adiciona um cenário mais binário para os ativos do Brasil, o que requer uma maior cautela na estruturação dos portfólios.

Como tenho comentado ao longo da semana, está se disseminando as expectativas de “lower prices for longer” no que diz respeito ao petróleo. É razoável supor que a queda de preço não continue na mesma velocidade e nem na mesma intensidade que estamos observando nos últimos dias. Períodos pontuais de alta podem (e devem) ocorrer. Contudo, me parece que estamos no meio de um processo onde o mundo está em busca do novo patamar de equilíbrio do preço do petróleo (patamar este que, hoje, me parece quase impossível afirmar ao certo qual seria). Assim, é natural passarmos por um período de maior volatilidade e incerteza.

Este cenário ocorre ao mesmo tempo, e não por coincidência, em um período de ajuste da economia da China. A tendência de depreciação da moeda do país é apenas uma das consequências deste processo de ajuste, com os preços mais baixos das commodities no mundo sendo uma outra resultante deste processo. O movimento da moeda chinesa é apenas a exacerbação de uma tendência que, na minha visão, promete ser estrutural e prolongada. Estamos no meio de um processo de ajuste dos países emergentes e da China, em especial, que passa a ser um país menos dependente do setor externo e do excesso de investimentos, para ser um país mais voltado para a demanda interna. Este processo, historicamente, acarretou em um período turbulento de transição para aqueles países que já passaram por momento semelhantes no passado (vide o que ocorreu com Japão na década de 80 e com os Tigres Asiáticos na década de 90). Os ativos chineses e dos países emergentes estão, assim, se adequando a esta nova realidade. A despeito de momentos pontuais de correção dessas tendências, o cenário estrutural de menor crescimento da China, fim do ambiente de juros zero nos EUA e ajuste dos fundamentos dos países emergentes segue inalterado, o que deve continuar colocando pressão nos ativos dependentes da demanda da China.

No Brasil, “it´s all about politics”. Os ativos locais simplesmente reprecificaram a probabilidade do impeachment. A carta de Michel Temer e a derrota do governo na votação de ontem a noite elevaram, em muito, a probabilidade de mudança política no Brasil. Acredito que estamos em um ambiente parecido com aquele que vigorou em setembro de 2014, período pré eleições presidenciais. Os ativos locais devem operar com muita volatilidade e poucas convicções até que este processo seja definido. Minha visão continua altista para o dólar, ajudado pelo cenário externo e pela necessidade de ajuste interno. Gosto de ter a opcionalidade via calls de Ibovespa (longas e fora do dinheiro), caso haja uma mudança política no Brasil. Ainda vejo um cenário favorável para o carrego de NTNBs mais curtas. O cenário de curto-prazo, contudo, requer um portfólio mais balanceado e com posições menores do que no passado recente, devido ao aumento da incerteza e da volatilidade dos ativos locais.


No cenário macro, segundo nossa área econômica, o IPCA ficou acima do esperado (+1,01% vs. BBG: +0,95%), com surpresa nos núcleos (+0,66% vs. AE: +0,61%) e em serviços (+0,46% vs. AE: +0,43%); Núcleos permanecem subindo em 12 meses, enquanto a inflação de serviços ficou de lado (em 8,4%), mesmo com toda a recessão corrente; O índice de difusão (percentual dos subitens em alta) ficou elevado (em 78%), nível bastante elevado para dada variação mensal; Em suma, o qualitativo do IPCA permanece bastante ruim...

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