Risk-On!

Sem uma deterioração adicional na relação entre EUA e China, e com uma retórica ainda conciliadora entre ambos os países, os ativos de risco estão apresentando forte recuperação essa manhã. Vale lembrar também que, a despeito de algumas surpresas negativas para o crescimento global nas últimas semanas, na sexta-feira observamos uma forte recuperação do Durable Goods Orders nos EUA. O número mostrou uma economia saudável e um crescimento em bases sólidas, a despeito de ruídos pontuais. Comentamos um pouco mais sobre esses temas abaixo.

No Brasil, a mídia segue dando atenção à situação do ex-presidente Lula e das articulações em torno das eleições. Não há nenhuma novidade, a meu ver, que seja de fato relevante para os ativos locais.

Na sexta-feira os ativos de risco deram continuidade ao movimento de “risk-off” que acabou marcando toda a semana. O destaque ficou por conta da pressão nas bolsas globais e do fechamento das taxas de juros nos países desenvolvidos. O dólar apresentou desempenho mais misto, os ativos emergentes foram foco de pressão, assim como as commodities metálicas, especialmente aquelas mais dependentes de crescimento.

O final de semana trouxe poucas novidades concretas. A mídia internacional continua focada na questão envolvendo a imposição de tarifas de importação por parte dos EUA e a resposta de seus “parceiros comerciais”, mas, em especial, por parte da China.

Não há novidades relevantes nesta frente. A China ameaça adotar uma postura de reciprocidade. Entretanto, ainda evita adotar uma posição mais dura, com foco em produtos mais relevantes para o comércio entre os dois países (como a Soja) ou tocando em temas mais polêmicos de forma oficial, como uma possível redução nas compras, ou até mesmo a venda, dos títulos de dívida dos EUA, cuja China é uma das maiores detentoras ao redor do mundo e, por várias vezes, a maior compradoras marginal.

Acho o momento oportuno para revermos o nosso cenário econômico e o que vem afetando o humor global a risco no curto-prazo. Nas últimas semanas, alguns temas merecem destaque, tais como, o maior protecionismo por parte dos EUA, sinais de desaceleração global e a sinalização, pelos principais bancos centrais do mundo, de que o processo de normalização monetária irá continuar, mesmo que de maneira gradual. Toquei mais a fundo nestes temas na sexta-feira e não alterei a minha visão sobre eles. A minha opinião pode ser lida aqui: https://mercadosglobais.blogspot.com.br/2018/03/tarifas-crescimento-e-bancos-centrais.html.


Vale adicionar um tema a estas questões de curto-prazo, que diz respeito a ruídos no setor de tecnologia na bolsa dos EUA. Não quero entrar aqui no mérito específico de problemas pontuais. Em termos gerais, contudo, os sinais recentes apontam na direção de uma maior regulamentação do setor como um todo, assim como na possibilidade de impostos mais elevados para essas empresas. Como o setor de tecnologia foi um dos mais favorecidos no processo de apreciação das bolsas ao redor do mundo desde a crise de 2008, não é de se espantar que vem sendo um dos setores mais pressionados recentemente. Este quadro pode continuar a trazer ruído para os mercados e se mostrar uma restrição para altas adicionais e/ou na mesma proporção daquelas vistas nos últimos anos.

No tocante ao cenário base de longo-prazo, ainda não vejo mudanças significativas que me levem a revisar a visão geral. Ainda vejo um crescimento global saudável. É verdade que talvez o pico do crescimento tenha sido feito, ou esteja sendo feito neste momento, mas acho muito cedo para nos preocuparmos com uma desaceleração mais abrupta do crescimento. Ainda temos políticas monetárias expansionistas, condições financeiras favoráveis e um impulso fiscal como não víamos há vários anos. Estes pilares deveriam sustentar o crescimento da economia mundial, mesmo que em ritmo inferior aquele verificado no último trimestre do ano passado e inicio deste ano.

O risco ao cenário base fica por conta de um eventual aperto exagerado das condições financeiras, devido a algum evento exógeno. O cenário de inflação, especialmente nos EUA, também merece destaque como um vetor que poderia testar o cenário base de forma mais surpreendente.

O cenário mais provável ainda é de uma aceleração gradual da inflação para a meta de 2% do Fed. Contudo, devido ao fechamento do hiato do produto e da economia no pleno emprego, este movimento poderia ser mais rápido e acentuado do que o consenso espera hoje, podendo levar a uma reação mais agressiva por parte do Fed. Este quadro poderia causar um aperto inesperado das condições financeiras. Continuo trabalhando com um cenário central de alta gradual da inflação, mas vejo uma probabilidade maior do que o mercado embute hoje deste cenário alternativo descrito acima. Preocupa-me um pouco a convicção do mercado de que o cenário inflacionário, neste estágio do ciclo econômico nos EUA, seja tão favorável.

Vejo a Europa em um estágio cerca de 3 a 4 anos atrás do estágio do ciclo dos EUA e o Japão cerca de 2 a 3 anos atrás do ciclo da Europa. A Inglaterra e o Canadá, contudo, parecem em ciclos mais próximos deste descrito acima para a economia norte americana.

A China se mostrou foco de estabilidade ao longo de 2017 e início de 2018. O cenário base ainda é de uma desaceleração do crescimento ao longo deste ano, porém de maneira gradual e bem conduzida. Como sempre, o risco é de que a desaceleração acabe sendo mais rápida e acentuada do que o esperado. Dado a transição política que está em fase avançada neste momento, tudo indica que o país irá seguir em um caminho de reformas, nem que isso implique em menor crescimento no curto-prazo. Com o poder mais concentrado e garantido nas mãos do atual Premier, uma desaceleração de curto-prazo não seria vista como um problema grave, contanto que tenha como objetivo dar bases mais solidas para a economia no futuro.

Desde que comecei a cobrir a economia da China, há 15 anos, todos os anos, menos em 2017, tivemos 1 ou 2 momentos em que houve algum tipo de questionamento (negativo) em relação a solidez da economia do país. Na maior parte das vezes, a desaceleração era pontual e o Governo foi capaz de conduzir o processo de maneira a evitar problemas mais graves na economia. Não descarto momentos mais incertos, mesmo que pontuais, para a economia do país ao longo deste ano. Será fundamental, todavia, entender qual a postura o Governo irá adotar para lidar com uma eventual desaceleração da economia.

É difícil falar dos países emergentes como um bloco único, dado as individualidades de cada país. Fazendo um esforço, contudo, podemos dizer que os países emergentes apresentam hoje fundamentos mais sólidos. As contas externas são mais saudáveis, os juros reais mais elevados, o crescimento mais sólido e a inflação mais baixa do que em momentos anteriores, como no “Taper Tantrum” de 2013. Alguns países, inclusive, mostram avanços no campo político, como Argentina, África do Sul, Brasil (?) e etc.

Dito tudo isso, ainda vejo um ano mais conturbado para os mercados financeiros globais. Enquanto o crescimento global ainda for robusto/saudável, fica difícil acreditar em um movimento mais acentuado e permanente de “Risk-Off”. Contudo, também não consigo mais ver todos os componentes que levaram ao cenário de “Goldilocks” que marcou os anos de 2016 e 2017.

Por isso tenho evocado aqui que o ano será de temas mais específicos de investimentos, de posições relativas e uma postura mais tática (curto-prazo) do que estratégica (longo-prazo). Tenho chamado este cenário de “corridas de 100m” e não de uma “maratona”.

Não a toa vemos muitas classes de ativos sem tendências definidas, sem grandes temas de investimentos. Já alertei aqui no passado que via o S&P500, por exemplo, entre 2.500 e 2.800, enquanto prevalecer este cenário descrito acima. O mesmo racional vale para as outras classes de ativos.

Finalmente, neste ambiente, mais do que no passado recente, a análise de posição técnica do mercado de preços e “valuations” ganham um peso ainda maior, tornando a gestão ativa de suma importância novamente. A busca por “alpha” este novamente na dianteira dos investimentos, em detrimento ao “buy and hold” da gestão passiva.

Visão & Posição:
- Nossa maior alocação continua a ser voltada para taxas de juros mais elevadas nos EUA. Preferimos a parte longa da curva. Estamos optando por estruturar as operações via opções longas, dado a volatilidade baixa e uma postura mais defensiva diante dos riscos de curto-prazo.
- Mantemos posições compradas em EUR e JPY, porém vendidas em AUD. As posições foram estruturadas de forma a ter perdas limitadas e alavancagem relevante.
- Na sexta-feira, zeramos nosso pequeno hedge através de “puts” (opções de venda) de S&P. Continuamos achando que o S&P deve permanecer em uma banda entre 2.500-2.800 no curto-prazo.
- No Brasil, seguimos com posição na parte longa da curva de NTN-B. Algumas opções “fora do dinheiro” se favoreceram da surpresa do comunicado do Copom.
- Estamos com uma pequena posição comprada em uma carteira de ações voltada para o mercado doméstico. A posição é hoje muito inferior ao que era no final de 2017 e começo de 2018.

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