Uma visão geral sobre o mercado de crédito corporativo nos EUA.


Nas últimas semanas e, especialmente, nos últimos dias, vimos aumentar o ruído em relação ao mercado de dívida corporativa nos EUA. Não apenas grandes e reconhecidos gestores de recursos vieram a público passar uma visão mais negativa deste mercado, como observamos uma deterioração razoável de preços, em especial no seguimento conhecido como “high yield” ou “junk bond”, a parcela mais arriscada desta classe de ativos (se não levarmos em conta os “leverage loans”, que diria que entram em outra classe, ainda mais agressiva e opca).

Meu intuito aqui e acompanhar este mercado de maneira mais profunda, tentando dar um panorama geral da situação ao longo das próximas semanas. O mercado de crédito é cerca de 3 vezes maior do que o mercado de renda variável, ou o mercado de ações, nos EUA. Diferente do mercado de ações, é um mercado um pouco mais opaco, pois sua negociação, em grande medida, é feita através do mercado de balcão, e não negociado de forma mais transparente como em alguma bolsa (NYSE, CME, CBOE e etc).

Desde a crise de 2008, contudo, este mercado passou a ter uma maior padronização e uma melhor regulamentação. Hoje, a maior parte deste mercado precisa ser cadastrado no DTCC (Depository Trust & Clearing Corporation) e é regulado segundo as regras do ISDA. Antes da crise de 2008, já existia o ISDA, mas de forma menos padronizada. Não existia uma entidade comum onde as operações eram registradas. Este foi um dos grandes desafios quando a Lehman Brothers quebrou.

Para acompanhar este mercado, a melhor forma são os índices de corporate bonds criados como veículos de investimentos, talvez os mais populares e conhecidos são do CDX, da Markit. Eles são operados em mercado de balcão, são líquidos, porém opacos para a maior parte dos investidores menos dedicados. A maneira mais fácil de investir e acompanhar os preços é através dos ETFs na bolsa dos EUA, HYG e JNK. Para pequenos investidores, recomendo os ETFs. Para grandes fundos, a liquidez e agilidade para operar este mercado será melhor via um grande dealer, através dos índices, como o CDX.

Recentemente, além do pano de fundo mais geral que escrevi recentemente neste fórum, algumas questões pontuais e localizadas, idiossincráticas, afetaram este mercado. Primeiro, a forte queda no preço do petróleo. As empresas do setor são relevantes neste mercado de dívida e nesses índices, o que acaba afetando muito o preço e a sensação geral sobre este mercado. Segundo, a derrocada da GE, uma das maiores tomadoras de empréstimo do mundo, com uma dívida que supera os US$150bi, ajudou a criar um clima de apreensão no mercado.

Nas próximas semanas tentarei escrever mais a fundo sobre este tema.

Escrevi um pouco sobre minha visão geral sobre este assunto recentemente. Vale a pena reforçar algumas questões (quem tem acompanhado este fórum pode encerrar por aqui):

Nos últimos dias virou consenso os obstáculos que o mercado de crédito corporativo dos EUA enfrenta, ou enfrentará, de agora em diante. Eu tenho está visão a algum tempo e tenho recomendado venda e JNK e HYG. Contudo, sempre fico com certo receio quando estes “calls” viram consensuais. Provavelmente, algum “bear market rally” nesta classe de ativo deverá ocorrer, mas sem alterar o cenário desafiador de longo-prazo para esta classe de ativo.

Não gosto de passar visões agressivas e assertivas, como falar em “bolha” neste mercado ou em uma nova crise financeira, desta vez começando no mercado de crédito corporativo. Contudo, tenho acompanhado esta classe mais no detalhe, pois acredito que é um setor que mostra vulnerabilidade e poderá trazer oportunidades de investimentos (negativos e, depois, positivos) ao longo do tempo.

De forma resumida, o cenário para as ações nos EUA terá que lidar com uma situação de menor demanda, seja pelo crescimento global ex-EUA ou mesmo por uma desaceleração branda da economia dos EUA, em meio a expectativas irrealistas de demanda a longo-prazo. Além de uma demanda menor, veremos aumento de custos, tanto de insumos como o custo do trabalho, derivado de um mercado de trabalho apertado, no pleno emprego, com o hiato do produto fechado. Isso irá levar a margens menores e, consequentemente, lucros menores. Isso tudo acontecerá em meio a expectativas, talvez, excessivamente otimistas e alocações elevadas nessa classe de ativos por alguns "players" do mercado.

Para complementar, e fazer o link para minha visão sobre o mercado de dívida corporativa, um tema que está bastante em voga, ainda temos empresas extremamente alavancadas, com uma piora da qualidade dos balanços. Muitas empresas pegaram empréstimos para recomprar ações. O mercado ignorava a situação enquanto as empresas cresciam, geravam lucros e os juros estavam baixos. Quando isso começa a virar, a situação se torna preocupante.


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