Artigo: O mercado de dívida corporativa nos EUA - O tamanho dos desafios da GE.


Dando seguimento aos artigos sobre o mercado de dívida corporativa nos EUA, o artigo de hoje tentará passar uma visão geral sobre o tamanho da dívida, e o tamanho do eventual problema, caso a situação da empresa GE – um dos maiores conglomerados industriais e financeiros dos EUA na última década – mostre deterioração adicional.

A GE apresentava, ao final de setembro, dívida da ordem de US$115 bilhões, contra um universo de dívida corporativa da ordem de US$5,8 trilhões nos EUA ao fim de 2017. O tamanho da GE para o mercado como um todo pode parecer pequeno, mas os efeitos colaterais são de difícil mensuração. Vale lembrar, também, que mesmo sendo proporcionalmente a todo o mercado um percentual pequeno, nominalmente é um valor que não pode ser desprezado.

A empresa já vem, desde 2010, em um processo relativamente agressivo de redução de dívida, que já foi reduzida na ordem de US$300 bilhões desde então. Contudo, a situação financeira da empresa mostra deterioração recorrente e acentuada nos últimos trimestres. O “free cash flow” nos primeiros 9 meses do ano foi negativo em torno de US$700mm, contra um saldo positivo de US$11 bilhões no ano fiscal de 2014.

No trimestre passado, a empresa anunciou uma perda de US$22,8 bilhões, cortou seu dividendo para 4 centavos de dólar e anunciou que está sendo investigada por questões relacionadas a sua contabilidade. Para finalizar, anunciou um “writedown” de US$22 bilhões na sua “power unit”, já que as perspectivas para a unidade se deterioraram fortemente.

A empresa enfrentará cerca de US$8 bilhões de vencimentos de dívida em 2019 e cerca de US$25 bilhões de vencimentos em 2020 e 2021 (vide gráfico da Bloomberg abaixo). Aqui, é importante ter em perspectiva que estes vencimentos ocorrem em um momento diferente dos mercados financeiros globais em relação ao ambiente que imperou desde a crise de 2008 até o início deste ano.

Após cerca de 10 anos de liquidez abundante, estamos passando por um período de redução de liquidez global, em que os bancos centrais e o Fed, nos EUA em especial, está no meio de um processo de redução de seu balanço. Para piorar a situação, o déficit fiscal americano aumentou após o pacote tributário aprovado pelo Congresso, o que demanda uma maior emissão de dívida soberana (em um momento de menor demanda). Este pano de fundo gera um efeito conhecido como “crowding out” (escrevi sobre isso aqui: https://mercadosglobais.blogspot.com/2018/11/artigo-o-mercado-de-divida-corporativa.html), em que o setor corporativo precisa competir com o setor público por demanda por emissões de dívida.

A empresa apresenta hoje uma relação de “debt-to-equity” na ordem de 3,6, um número elevado, especialmente se levar em conta o panorama que citamos acima. A GE teve seu “rating” recentemente rebaixado para um nível a 3 degraus de ser considerada “junk bond” (ou um papel de menor qualidade e maior risco). Contudo, no mercado, seus papeis já operam em níveis “junk”. Sua dívida com vencimento em janeiro de 2023, cerca de US$1,3 bilhões, deixaram de pagar uma taxa de 2,8% e já pagam uma taxa de 6,2% ao longo deste ano.

A empresa ainda detém ativos com valor de mercado considerável, como a sua unidade de aviação. Segundo cálculos de mercado, está unidade compreende cerca de 2 mil aeronaves, que são alugadas para uma série de empresas. Seriam cerca de US$41 bilhões em ativos.

Os próximos capítulos desta saga serão definidos pela capacidade do “management” da empresa em conduzir esta situação em um ambiente global mais desafiador. Não só a empresa precisará comprovar o valor de seus ativos, como precisará ser ágil o suficiente para promover as vendas necessárias, e a liquidez necessária, para que o mercado continue financiando a empresa.

Fonte: Bloomberg.

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