Artigo: O mercado de dívida corporativa nos EUA e o Brasil.
Continuando a série
sobre o mercado de crédito corporativo nos EUA (a primeira parte da série pode
ser lida aqui: https://mercadosglobais.blogspot.com/2018/11/uma-visao-geral-sobre-o-mercado-de.html).
O mercado de
crédito nos EUA cresceu exponencialmente nos últimos anos. Só no ano passado
saiu de cerca de US$4 trilhões para algo em torno de US$ 5,8 trilhões.
Este efeito foi
uma clara, e talvez esperada e induzida consequência do maciço processo de injeção
de liquidez promovido pelos principais bancos centrais ao redor do mundo. De
2008 até o ano passado, os bancos centrais injetavam liquidez na economia,
retirando títulos de risco mais baixo e induzindo o mercado às classes de
ativos mais arriscadas. O mercado de dívida corporativa foi um dos grandes
beneficiários deste movimento.
Desde fevereiro
deste ano, quando o processo de redução do balanço do Fed ganhou corpo, assim
como o seu processo de alta nas taxas de juros, começamos a ver os efeitos mais
negativos deste processo. Aos poucos, começamos a observar movimentos de
correção, realizações de lucros, em diversos mercados distintos (Emergentes
como um todo, bolsas, agora o setor de tecnologia da bolsa dos EUA).
Nas últimas
semanas, com algumas questões localizadas tornando-se mais latentes (GE e queda
do petróleo), o mercado de crédito nos EUA entrou no radar dos investidores e
ganhou as primeiras páginas dos jornais.
Vale lembrar que
este processo de normalização monetária avança em um momento em que a economia
dos EUA apresenta elevados déficits fiscais oriundos do pacote de estímulos
aprovado pelo Congresso Americano. Em outras palavras, em um momento em que o
Tesouro precisa emitir mais papéis, a demanda para estes papeis se torna menor,
pois o principal comprador, o Fed, está não apenas fora do mercado, como está
vendendo papeis ou deixando-os vencer.
Este cenário
descrito acima acaba levando a um movimento cunhado de “crowding out”. De maneira
simples, a maior oferta de títulos soberanos e a menor demanda, acaba “empurrando”
o investidor para fora do mercado de dívida corporativa, pois a competição pela
demanda do mercado se torna maior, em um momento de oferta farta de outros
títulos (neste caso, soberanos).
Para piorar a
situação, a qualidade do crédito corporativo nos EUA piorou de maneira gritante
nos últimos anos. Segundo a PIMCO, a parcela do mercado conhecida como BBB, o
menor rating para ser reconhecido
como “Investment Grade” (IG), ou aquela parcela com melhor qualidade de crédito
e, consequentemente, menor risco de crédito, saiu de 25% na década de 90 para cerca
de 48% em 2017.
O mercado de crédito
BBB é hoje maior do que o mercado de crédito BB, ou “Junk Bonds”, a parcela
mais arriscada deste mercado (não considerando “Leverage Loans”).
A alavancagem das
empresas BBB era em torno de 1,7x em 2000. Em 2017 chegou a 2,9x. Em 2006 apenas
6% do universo de IG tinha alavancagem maior do que 4x, em 2017 este universo
era de 19%. Somente 26% dos IG não financeiros tinham em 2017 alavancagem menor
do que 2x, enquanto este número era de 55% em 2010 (fonte: PIMCO).
Ter estes números
em mente, em um momento em que a GE entra no “olho do furação” do mercado são
importantes. A GE ainda é uma empresa IG, mas está prestes a se tornar uma
empresa “High Yield” ou “Junk”.
O mercado deverá
continuar olhando os desdobramentos da GE no detalhe, pois os riscos
provenientes deste mercado são reais e crescentes.
Vale deixar claro
aqui que o Brasil passa por um momento oposto a este. As empresas aproveitaram
a crise recente para desalavancar seus balanços, reduzir dívida. Na média,
sempre haverá exceções, as empresas locais estão com menor dívida, estão mais liquidas,
e com suas estruturas mais ajustadas para um eventual novo ciclo de
crescimento. Além disso, as sinalizações do novo governo são na direção de
estimular o mercado de capitais, reduzindo burocracia e aumentando a liquidez e
os incentivos deste mercado de dívida. O objetivo é não apenas criar uma fonte
adicional de financiamento para as empresas, como popularizar este tipo de
investimento ao grande público.
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